Ano novo, personagem novo.O Cantor Inglês David Bowie anuncia que agora será Aladdin Sane, um personagem mais insinuante que Ziggy Stardust, personagem do seu disco anterior,
The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars. Com novas composições sendo escritas desde setembro de 1972, Bowie termina as gravações do novo disco no dia 24 de janeiro de 1973 e no dia faz outra viagem de navio até Nova York.
Enquanto isso, Tony DeFries, seu empresário, negocia um novo contrato com a RCA e consegue um aumento. Ao invés dos US$ 37.500 dólares de adiantamento para cada disco, a cifra aumenta para US$ 60 mil em 1973 e US$100 mil, em 1974, além de um aumento nos royalties.
DeFries começa a planejar uma nova turnê de três semanas pela América, mas sem a multidão da excursão anterior. Agora será apenas Bowie, seguranças e a banda. Mas a selvageria continua. Bowie continua cercado de fãs, e dorme com várias delas, ao mesmo tempo em que Angela tinha um caso com o principal segurança do cantor, Dennis.
A turnê abre no Royal Albert Hall, com lotação esgotada e mais de 6 mil clones de Ziggy na audiência. Entre eles, estão Truman Capote, Salvador Dali, Johnny Winter e Todd Rundgren. Durante "Rock 'n' Roll Suicide", Bowie desmaia após um fã pular ao palco. Ele é atendido por uma enfermeira que diagnostica cansaço e Bowie dorme cerca de 12 horas no dia seguinte.
Amigos mais próximos começam a reparar uma mudança drástica na personalidade de Bowie, que encarna ao extremo Ziggy Stardust, abusando das drogas e tendo um estilo de vida absolutamente selvagem. Apesar de magro, Bowie consegue ficar ainda mais debilitado, chegando a pesar apenas 50 kg.
Em fevereiro é lançado um LP duplo pela sua antiga gravadora, London, chamado Images 1966-67, tentando faturar em cima da fama Ziggy, da mesma forma que a RCA tinha lançado no final de 1972 um EP com as canções "Space Oddity", "Moonage Daydream", "Life on Mars?" e "Ain't It Easy".
Em março, janta com o baterista Ringo Starr e dias antes é ameaçado por um fã maluco, de cabelo rosa que o ameaçou matá-lo, para desespero do já paranóico Bowie.
Em abril é lançado um novo compacto, com as canções "Drive-In Saturday" e "Round and Round". O compacto chega ao 3º posto no Reino Unido.
Dois dias depois, Bowie é recebido no Japão, onde faria sua primeira excursão, em clima de total histeria. Bowie é cercado e paparicado pelos japoneses de uma maneira mais intensa do que no Reino Unido. Junto de si, leva a banda, que além dos habituais Mick Ronson, Trevor Bolder, Mick Woodmansey e Mike Garson, contava ainda com o segundo guitarrista John Hutchinson e o saxofonista Ken Fordham.
Bowie usa alguns quimonos durante os shows feitos pelo estilista Kansai Yamamoto, que havia conhecido meses antes, em Nova York. Inspirados no teatro Kabuki, enquanto o fotógrafo Masayoshi Sukita é nomeado assistente do cantor durante sua estadia.
Em 6 de abril é lançado o novo LP, Aladdin Sane. Com vendas antecipadas de 100 mil cópias, é o disco que mais rapidamente vendeu desde o famoso disco The Beatles, também conhecido como Álbum Branco e vai direto ao posto da parada britânica e chega ao 17º lugar nos EUA.Segundo Bowie, seu novo personagem era "Ziggy na América". O nome também fazia um trocadilho com a frase "a land insane (uma terra insana)", que era como Bowie via os Estados Unidos. E a América, aos olhos de Ziggy não era normal. Bowie estava fascinando pelo país e desenvolvia uma relação de amor e ódio pela América.
O Disco
Lado 1
1. "Watch That Man" – 4:25
2. "Aladdin Sane" – 5:06
3. "Drive-In Saturday" – 4:29
4. "Panic in Detroit" – 4:25
5. "Cracked Actor" – 2:56
Lado 2
1 . "Time" – 5:09
2 . "The Prettiest Star" – 3:26
3 . "Let's Spend the Night Together" (Mick Jagger, Keith Richards) – 3:03
4 . "The Jean Genie" – 4:02
5 . "Lady Grinning Soul" – 3:46
A América de Bowie era decadente, selvagem e abre com a furiosa "Watch That Man", inspirada no disco Exile on Main St. dos Rolling Stones. Um rock and roll simples, selvagem, rápido.
A segunda faixa é uma das assinaturas de Bowie. A faixa-título. A faixa tinha dois nomes possíveis: " A Lad Insane" e "Love Aladdin Vein", descartada por possíveis alusões às drogas. A letra havia sido inspirada no livro Vile Bodies de Evelyn Waugh.
Bowie viu na estória recheada frivolidade, decadência, uma eminente catástrofe e um interessante paralelo com a sociedade atual. No final, Bowie canta trechos de "On Broadway", clássico dos Drifters, de 1960. O grande charme da faixa é o espetacular solo de Garson ao piano, no melhor estilo avant-garde. Garson conta que esse solo o marcou para sempre: "até hoje, eu falo mais sobre esse solo do que os outros 11 discos que fiz antes, os outros seis que fiz como co-líder de uma banda ou as centenas de gravações que realizei com outros artistas. E duvido que pare de responder as perguntas sobre isto!"
Bowie também brincava com a salsa em "Panic in Detroit" e enfrentou resistências da RCA na faixa "Time". A primeira faixa do lado B falava de masturbação masculina, prostitutas e citava Quaaludes e Billy Doll. Billy Doll era nada menos que Billy Murcia, baterista do New York Dolls, que havia morridos meses antes, em Londres, em uma festa, após ingestão de Quaaludes. O disco trazia ainda uma versão do clássico dos Stones, "Let's Spend the Night Together" e uma homenagem à Iggy Pop, em "Jean Genie". Após a excursão, em mais uma excentricidade, Bowie resolveu pegar o Trans-Siberian Express, ao lado de Leee Childers, vice-presidente da MainMan na América. Uma semana depois estavam em Moscou, onde ficaram dois dias e logo pegaram o Orient Express para Paris, onde encontraram Jacques Brel, retornando em seguida à Londres. Bowie diria que ficara com medo com a probreza vista dentro da União Soviética e que estava aliviado de ter voltado ao "lado ocidental."
Bowie retorna então à Londres para a terceira e última turnê de Ziggy na Inglaterra. Serão 45 shows em 37 cidades e a abertura será em um local novo, o Earl's Court, com capacidade para 18 mil pessoas. O show é um fracasso, devido ao tamanho do palco e as novas estruturas e o segundo show que estava marcado no mesmo local é cancelado. Começava mal a turnê de despedida.
A turnê segue com alguns problemas e apresentações canceladas em alguns lugares e fãs selvagens e sedentos por tocar em Ziggy. Enquanto isso, a RCA pressiona DeFries para uma volta à América, já que a MainMan deve mais de US$ 150 mil à gravadora. DeFries quer tocar em arenas, mas a gravadora prefere locais menores, porém mais datas. O impasse é mantido por meses.
No dia 1º de junho é editado o disco Raw Power, creditado a Iggy & The Stooges. Bowie havia mixado o disco, apesar de Iggy ser contrário à idéia. Seria o último álbum dos Stooges em décadas.
A estafante maratona de turnês tinha criado uma necessidade imensa de privacidade em Bowie. Ele não suportava mais a histeria dos fãs, da mídia. Ao mesmo tempo, alguns outros astros anunciavam sua "aposentadoria", casos de Ray Davies, líder dos Kinks e Elton John. Bowie pensava também nisso, seriamente, embora não tivesse avisado ninguém.
No dia 3 de julho aconteceria o último show da turnê britânica. A RCA pressionava DeFries e Bowie para um novo giro pela América. O concerto no Hammersmith Odeon para 3500 pessoas, foi cercado de grande expectativa, já que seria filmado por D.A Pennebaker, o mesmo diretor de Don't Look Back, filme que registrou a turnê de Bob Dylan, em 1965. Além do filme, havia um plano de lançar um disco duplo, em fevereiro de 1974, com o possível título sendo BOWIE-ING OUT.
O show segue o roteiro habitual, até que Bowie pronuncia as seguintes palavras antes de fechar com "Rock 'n' Roll Suicide": "Everybody...this has been one of the greatest tours of our lives. I would like to thank the band. I would like to thank our road crew. I would like to thank our lighting people. Of all of the shows on this tour, this particular show will remain with us the longest (cheers from the audience) because not only is it...not only is it the last show of the tour, but its the last show that we'll ever do. Thank you."
Foi um choque. Para os fãs, para a gravadora, para a banda e para DeFries. Bowie resolvera dizer adeus sem avisar a ninguém. Ziggy estava morto e Bowie aposentado.
O disco duplo não foi editado em fevereiro de 1974, mas quase 10 anos depois, em 1983, duplo como planejado. E o que era para ser apenas um álbum da turnê acabou virando um documento histórico.
The Motion Picture Ziggy Stardust traz todas as faixas e na seqüência correta do filme, excetuando as duas em que há participação do guitarrista Jeff Beck. O disco acabou sendo remixado em 1983 para a adição de backing vocals e de um órgão em "My Death", de Jacques Brel.
Logo após o show, um frenesi tomou conta de DeFries e a da RCA, já que o empresário havia concordado com a gravadora e agendado nova turnê na América, com 38 datas a serem iniciadas em 1º de setembro, em Toronto e finalizando em 31 de outubro, em San Antonio, Texas. E De Fries tinha planos ainda maiores. A idéias era que a turnê tivesse 70 shows na América e que depois rumasse para União Soviética e China, em 1974.
Mas Bowie se aposentara, deixando dívidas em aberto, planos cancelados. Anos depois, ele revelou porque havia tomado tal decisão: "eu queria tudo ligado à MainMan ficasse bem longe de mim. Aquilo era um circo, e nunca quis aquele monte de gente ao meu lado, odiava aquilo tudo. Foi um alívio após todos aqueles anos... se eu sentasse em uma mesa, outras 15 pessoas sentavam comigo."
Após quatro dias de descanso, Bowie pegou um barco para Paris, no dia 8, rumando diretamente ao Château d'Hérouville para gravar um disco novo. Ele iria lançar um disco apenas de covers, contendo as suas canções favoritas dos grupos britânicos, dos anos 60. Além dele, Bryan Ferry havia tido uma idéia semelhante e estava gravando o disco These Foolish Things. Quando o líder do Roxy Music, soube que Bowie havia tido a mesma idéia, ficou furioso e tentou, inutilmente, forçar a Island a abrir um processo contra a RCA. Ferry sabia que seu disco seria totalmente eclipsado.
O nome do disco era Pin Ups, mas isso já é outra história
Texto: Fonte site Mofo.